segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Meu cabelo não é monstro, não.


Faz tempo não venho por aqui. Motivos pessoais, correria da vida. Só não esperava partilhar com vocês, algo para mim, tão retrógrado nos dias de hoje. 

Sou atriz e fui convidada para fazer uma participação numa cena de novela em que meu cabelo estaria recebendo uma tintura. Perguntei ao produtor de elenco como seria realizada a cena, ele explicou: "Não se preocupe Patrícia, vão colocar uma pasta que parece tintura, mas sai com água". Falei de um jeito jocoso: "Ah, legal, porque é sempre bom perguntar, né?" E avisei: "Olha, meu cabelo está afro natural, é black. Sem química alguma." O produtor respondeu: "Sei, vi seu vídeo. É isso mesmo. Inclusive, gostei da cena que você fez. Tá engraçada. E também, te vi no teatro. O clima da cena é esse mesmo, um salão popular."

Ele comentou que tinha assistido comigo o espetáculo "É samba na veia, é Candeia", que tinha gostado e coisa e tal. Completei: "Pois então, naquele espetáculo meu cabelo estava esticado. Ele não está mais assim." Frisei: "Tá black". Ele falou: "É isso mesmo, o que a gente quer."
E então, continuamos os tramites normais: data, hora, etc.

Como era uma cena de primeiro capítulo que requer muitos cuidados, acabei sendo convocada para no dia anterior a gravação, fazer uma leitura da cena com as atrizes e a direção. Foi legal, conheci a equipe, lemos a cena, a direção gostou, se falou do cenário, do figurino... E, de como seria feita a tal da tintura? Nada... Bom, fiquei tranquila. Afinal, não era minha função. Fui prestar um serviço de atriz.

No dia seguinte, lá estava eu, pronta para o trabalho. A equipe bem atenciosa, sabia meu nome e a personagem que eu faria: cliente 2. É gente, a tv ainda não descobriu meu talento. rs

Troquei figurino, a manicure fez minha mão, fui maquiada, hora rolando e ninguém se prontificava a preparar meu cabelo pra cena. Então perguntei: "E o cabelo? Como vai ser a tintura?"
Eis que o cabeleireiro chefe, que no meu ponto de vista deveria estar ciente da cena, quase teve um treco quando viu meu cabelo. E disse, sem olhar para mim: "Como assim?! Essas pessoas não pensam? Como é que vou fazer uma cena de tintura nesse cabelo? Esse cabelo é black!!" E continuou: "Chama outra menina aí, de cabelo liso pra fazer a cena, ora."

Respirei fundo e confesso que fiquei sem reação, até porque a criatura era tão negra quanto eu. Alguém disse pra ele: "Mas, ela é atriz, tem texto."  Ele perguntou, afrontado: "Qual texto?" Mantive a calma e falei: "Fulana, você acha que essa tintura dura quanto tempo no meu cabelo?" Sim, era só isso que eu falava. Mas, fui respeitosamente convidada pelo produtor de elenco, que conhece meu trabalho como atriz para fazer a cena. Ah, se soubesse que ia passar esse tipo de situação... Ninguém merece.

A criatura era negra e usava uma careca raspada. E foi deixando claro, a cada argumentação para se modificar o texto da cena, que era uma pessoa que não entendia, não assumia e desrespeitava a própria identidade. Se revelou um profissional incompetente e preconceituoso. E ficou debatendo comigo, dizendo que entendia mais, porque ele era cabeleireiro.

Não me descontrolei e disse com bom humor: "Só sei que eu pinto meu cabelo... Ele não é monstro, não. Seria muito interessante a televisão mostrar que esse tipo de cabelo se pinta. Você não acha?" Sorri.

Não, ele não achava. Disse que eu tinha que aparecer bonita no vídeo. Ok, quer dizer então que meu cabelo de preto não é bonito? Que eu não sou bonita? Rebati, achando graça do ridículo: "Eu adoro o meu cabelo, eu sou bonita!" Quanta indelicadeza... Cá pra nós, o conceituado cabeleireiro deveria entender de todos os tipos de cabelos, se fosse um bom profissional. Mas, fazer o que? Eu estava matando meu leão de cada dia, preferi não levar tão a sério o negócio.

Daí veio uma série de equívocos: acharam que tinham que empastelar meu cabelo de creme pra ele abaixar, que tinham que mudar a situação do texto pra relaxamento. Um monte de baboseira.

Conclusão, no meio de tanta ignorância, me saí na melhor. A gravação rendeu três diárias, recebi de brinde três dias seguidos de uma super hidratação, que deve estar custando umas trezentas pratas por aí e nem vai aparecer na cena. 

Pensar que estamos em 2012 e existem pessoas que ainda insistem em ficar pra trás...
Vamos evoluir, minha gente, nos informar. Abaixo o preconceito.





7 comentários:

Anônimo disse...

Olha Patrícia...realmente lamentável...sinto muito que vc tenha passado por isso!!! Mas como um ser superior, teve jogo de cintura e soube levar na esportiva! Párabéns...e como diz um canção que gosto muito..." Se um porta se fecha aqui, OUTRAS PORTAS se abrem ali"...que Deus te abençõe e que vc seja muito bem sucedida na sua carreira e que essa pedrinha sirva pra vc construir o seu castelo!!! Bjãoooo

Adriana Firmiano disse...

Oi Patrícia, essa foi uma situação muito desagradável e a atitude foi lamentável, principalmente vinda de um profissional, mas temos que entender a ignorância deste cabeleireiro, pois ele ainda não tem a competência pra cuidar de cabelos crespos e sabemos que ele não é exceção. Caso ele ainda queira se manter no mercado, terá que aprendê-lo, pois estamos crescendo, mais e mais mulheres estão tendo o mesmo sentimento e vontade de deixar a química e voltar ao crespo, isto é uma realidade e ele terá que encarar esta situação de forma diferente. A você, vejo que se saiu bem, tranquila e mais forte. Crespa e linda como sempre. Vamos lá, espero mais vídeos, não pare com o blog. Grande beijo.

Adriana Firmiano disse...

Oi Patricia, tudo bem? Muito chata esta situação, mas este é mais um profissional sem a competência necessária para atender a todos os públicos, mas ele vai ter que aprender, pois o número de crespas aumenta e nós vamos precisar de profissionais de qualidade pra cuidar dos nosso cabelos, esta é uma realidade da qual este rapaz não vai poder fugir. E você, tenho certeza de que saiu muito mais fortalecida. Grande beijo e não deixe de fazer seus vídeos, muito do meu parco conhecimento de cuidados com cabelos crespos vieram deste blog.

Mirna disse...

Olá Patricia, eu tenho cabelo ondulado. O que recomendás-me para o meu cabelo, porque eu tenho frizz, um fixador para o redutor de volume?

PATRÍCIA COSTA disse...

É isso aí, Adriana. Vamos cultivando o black e aprendendo a cuidar dele que é o melhor q a gente faz. Afinal, quem ama cuida. Beijos!

Bê Cruz disse...

Lamentável é BOLINHO.
É cada uma... Triste o povo negro ter esse tipo de atitude com os seus.
Ia ficar tão feliz em ver um cabelo igual o meu na TV. As crianças crespas nem se fala.
Sua postura foi perfeita. Quem perdeu foi eles, pena.

Beijão!

Brenda Lima disse...

CARACAS, triste ein? mas relaxa

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